segunda-feira, 2 de janeiro de 2012

septuagésimo sexto ~


A linha tênue entre o que eu sou e o que eu quero ser começa a ficar confusa; E quando foi que aconteceu o fim do que eu costumava ser? Onde será então que eu me encontro verdadeiramente? Começo, meio e fim – mas talvez a vida não possa ser dividida assim, diretamente.
O que eu quero ser vira o objetivo, o final da vida, a felicidade suprema, enquanto o que eu fui torna-se o caminho. Não vejo necessidade de explicar-me para mim mesma. Mas será que por isso, tenho o fim da divisão objetiva de minha vida? Não acho completamente necessária a divisão; mas preciso do entendimento – preciso que se torne claro em minha mente tudo o que eu, de fato, sou.
Memórias se tornam irreais – mas como um fragmento de realidade passada pode não fazer mais parte do real? Mas também, como uma lembrança pode trazer a carga real do que já passou? Sentimentos antigos e pessoas passadas vão se modificando lentamente, saindo da memória e se tornando invenções confusas. Quem eu fui não traduz quem eu serei; mas quem eu sou modifica quem eu posso ser. Mas não posso recair sobre o eixo das inúmeras possibilidades sem reconhecer a minha carga de responsabilidade de decisão.
O sorriso passado pode, rapidamente, virar tristeza quando o sentimento é modificado. O momento de mudança pode virar mundano quando se torna ordinário. Mas não consigo me manter constante – ou até mesmo me manter clara, conhecendo as possibilidades do que eu posso sentir. Não quero me manter única, sabendo que posso ser dominada pelo prazer da dualidade. Não tenho como me manter única, sabendo que um sentimento sempre irá se complementar pelo seu exato oposto dual. O que seria de minha certeza, se eu já não soubesse da incerteza que senti? O que seria de mim, se eu não soubesse o que eu ouso dizer que sei?
O momento grandioso em que a vida faz sentido de fato. O momento em que eu sou, em um único segundo, tudo o que eu posso ser; e a vida se faz plena e as dualidades se encontram. O feio se faz bonito e a incerteza torna-se a única certeza que tenho. Talvez eu já seja, mesmo que internamente, tudo o que eu possa ser – porém ainda não saiba como tornar-me isso de forma plena.
De que me adianta pensar sobre ser porém não ser? Vejo mais motivos para me esforçar do que para me manter parada; mais motivos para mudar do que permanecer. Dependência da certeza nunca irá me tirar do lugar. Preciso da dependência de mim. E só assim serei – o quê? Pouco importa.


[Texto escrito no último dia de 2011, fruto de uma noite sem sono e muita inquietação]